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Maquiavel

Os escritos de Nicolau Maquiavel ainda fascinam e provocam repulsa em muitas pessoas. Visto como defensor de um governante violento, foi um grande apreciador da República.

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Nicolau Maquiavel, embora seja muito conhecido por seus pensamentos sobre a dinâmica real do poder, também escreveu comédias e poemas. Uma conhecida pintura de Santi di Tito, finalizada em meados de 1600, muitos anos após a morte desse pensador, apresenta-o ainda jovem e com um sorriso que confirma o tom irônico ou bem-humorado com o qual as biografias recentes retratam-no.

Não elaborou uma teoria política ou uma reflexão profunda sobre a essência do poder, como se poderia esperar de um filósofo em sentido clássico. Em todo caso, suas reflexões são originais e baseadas em uma riqueza de eventos históricos. Seu pensamento político orientou-se pelos fatos que vivenciou e em suas interpretações com base em circunstâncias históricas, afastando-se, assim, de abstrações ou idealizações.

Nicolau Maquiavel é entendido como o inaugurador da vertente realista em política.
Nicolau Maquiavel é entendido como o inaugurador da vertente realista em política.

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Biografia de Nicolau Maquiavel

Nicolau Maquiavel (Niccolò di Bernardo dei Machiavelli) viveu durante o renascimento italiano. Nascido em 1469, na cidade de Florença (Itália), pertenceu a uma família de poucas posses e atuou como um secretário que cuidava dos assuntos externos (serviço equivalente hoje ao de um diplomata). Seu pai, Bernardo di Niccolò di Bouoninsegna, era versado em leis e pouco se sabe sobre sua mãe, Bartolomea di Stefano Nelli. Duas irmãs mais velhas, Primavera e Margherita, e o caçula Totto completavam a família.

Há poucos registros sobre sua juventude, mas é indicado como pessoa bem-humorada e jovial. Casou-se com Marietta Corsini, em 1501, e tiveram quatro filhos e duas filhas. Apesar de suas ausências, em virtude das viagens, provia auxílio por meio de ajudantes. Mesmo sendo indicado como um pai carinhoso, a vida familiar não o satisfazia e frequentava tavernas e festas pela cidade.

Sempre se dedicou, contudo, aos estudos, recomendação que deixou a seu filho Guido em uma carta. As reviravoltas na política e disputas pelo poder que testemunhou nessas missões em sua própria cidade é o que confere aos seus escritos o famoso realismo. É o fim do governo de Lorenzo de Medici que marca o início das missões de Maquiavel a serviço da República, quando já estava com quase 30 anos.

O cargo de secretário é concedido em 1498, por uma indicação do Grande Conselho, e logo depois começa a ser enviado em missões de cunho diplomático. Por meio de suas muitas missões, adquire experiência como estrategista e expressa seminalmente seu pensamento político em relatórios e discursos sobre essas experiências. Em 1505, um problema relacionado aos mercenários, na guerra contra a cidade de Pisa, faz com que as autoridades aceitem a proposta de formar um exército nacional.

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Os Medici conseguem retornar ao poder em 1512, e, em fevereiro de 1513, Nicolau Maquiavel é envolvido injustamente em uma tentativa de conspiração, sendo aprisionado em uma cela próxima de onde costumava trabalhar. Recusa a confissão forçada, mesmo sob tortura.

É liberado algumas semanas depois, mas abandona Florença e segue para sua casa em Sant'Andrea em Percussina (local que existe ainda hoje). A perda do cargo e a saída repentina deixam Nicolau Maquiavel desanimado, mas o tempo serve-lhe como oportunidade para escrever suas reflexões sobre a arte de governar.

Os principais escritos em que expõe seu pensamento político — O príncipe e Comentários sobre a primeira década de Tito Lívio — são publicados postumamente, em torno de 1532, mas chegou a ler trechos deles em ocasiões específicas, e alguns manuscritos circularam logo após serem finalizados. Começa também a escrever suas peças, a mais relevante intitulada A mandrágora, que foi apresentada em Veneza e continuou sendo aplaudida posteriormente.

Em meados de 1520, retomou algumas atividades políticas, mesmo sem o prestígio de outrora, e Júlio de Médici encomenda a História de Florença, que foi concluída cinco anos depois, mas também publicada postumamente. Mesmo com a queda dos Medici e o retorno da República, em 1527, não tem seu desejo de ocupar novamente o cargo para o qual dedicou anos de sua vida satisfeito. Francesco Tarugi é nomeado, e o grande pensador florentino adoece logo em seguida. Seu filho Piero, em carta, comenta que Nicolau Maquiavel faleceu após tomar um remédio que lhe causou fortes dores no estômago, em 21 de junho de 1527.

Saiba mais: Filosofia moderna: período filosófico do qual Maquiavel fez parte

Principais ideias

A obra mais conhecida de Nicolau Maquiavel é certamente O príncipe, que começa a ser escrito em meados de 1512. Nele as ideias são expostas de forma clara, e seu pensamento político entende a política como um fim em si mesma. A avaliação das ações de um governante toma por base os fatos que se apresentam e não valorações de qualquer âmbito.

É direto quanto ao objetivo de seu príncipe: conquistar e manter o poder. É certo que os meios práticos de conseguir êxito dependem de várias circunstâncias, por isso a leitura dessa obra é permeada pelo par conceitual fortuna e virtú. Poucas leituras bastam para perceber que esses termos não são usados em um sentido comum.

Por fortuna, entende-se a indicação dos aspectos circunstanciais e pouco previsíveis que resultam em benefício ou malefício. Não se trata de uma força sobrenatural, mas do próprio desdobramento natural de tudo o que envolve ou afeta o humano (decisões, enfermidades etc.). Já virtú são as características pessoais que auxiliam o governante a garantir seu objetivo. Trata-se, por exemplo, da astúcia, da virilidade e flexibilidade.

Os preceitos estariam entre a lei e a força, já que o governante não deve basear suas decisões no que imagina ser o caso, mas perceber que as pessoas não são essencialmente boas e poderiam adotar meios escusos para seus fins. Nicolau Maquiavel sabia que as decisões dependiam do contexto, por isso suas reflexões são inerentes à dinâmica do poder: é preciso aparentar ser bondoso, mas saber usar de violência.

“A história era para Maquiavel a grande mestra, a fonte mais segura de ensinamentos, pois o que ocorrera no passado tendia inevitavelmente, a seu ver, a repetir-se no presente e no futuro. Todas as coisas do mundo, em todos os tempos, dizia ele, encontram seu paralelo nos tempos antigos. O que resulta do fato de serem elas dirigidas pelos homens, que têm e sempre tiveram as mesmas paixões, de tal modo que necessariamente os efeitos são sempre os mesmos.” |1|

Em Comentários sobre a primeira década de Tito Lívio, obra também referida simplesmente como Discorsi, o autor propõe comparações de algumas situações políticas de sua época com fatos ocorridos na Antiguidade, a fim de que fossem divulgados bons exemplos de como agir politicamente. Exemplos que não deveriam ser apenas admirados, mas imitados. Embora tenha sido escrito quase ao mesmo tempo que sua obra mais conhecida, não teve a mesma repercussão. É nesse livro, em todo caso, que encontramos a exposição de algumas ideias republicanas, em que se valoriza a Roma antiga.

Em A arte da guerra (1521), Maquiavel apresenta um diálogo entre dois personagens sobre temas de cunho militar: a formação de um exército, seus armamentos etc. Esse escrito pode ser interpretado como uma recomendação à formação de uma força nacional de cidadãos em lugar da contratação de mercenários, que era a prática na Florença de sua época. O objetivo seria não apenas a proteção contra inimigos externos mas também contra os excessos de um eventual governante tirânico

Suas ideias continuam sendo alvo de inúmeras reflexões e formaram a base do pensamento realista em ciência política. É uma interpretação considerada equivocada atribuir certo utilitarismo a Nicolau Maquiavel, já que este não propôs como regra que “os fins justificam os meios”. Pode-se dizer que a imoralidade atribuída a suas reflexões é fruto de uma leitura historicamente descontextualizada e textualmente seletiva.

Leia também:  Thomas Hobbes: filósofo influenciado pelas ideias de Maquiavel

Principais obras e citações

O príncipe

“Poderia alguém perguntar-se de que forma Agátocles e outros semelhantes, após infinitas traições e crueldades, puderam viver seguros em sua pátria e defenderem-se dos inimigos externos por longo tempo, sem que jamais seus súditos tivessem conspirado contra eles, enquanto muitos outros, empregando a crueldade, não conseguiram manter seus estados, nem nos tempos de paz, nem nos incertos tempos de guerra. Creio que isso resulta da crueldade mal empregada ou bem empregada. São bem empregadas as crueldades (se é legítimo falar bem do mal) que se fazem de uma só vez pela necessidade de garantir-se e depois não se insiste mais em fazer, mas rendem o máximo possível de utilidade para os súditos. Mal empregadas são aquelas que, ainda que de início sejam poucas, crescem com o tempo, ao invés de se extinguirem.” 

Comentários sobre a primeira década de Tito Lívio

“É evidente que o interesse comum só é respeitado nas Repúblicas: tudo o que pode trazer vantagem geral é nelas conseguido sem obstáculos. Se uma certa medida prejudica um ou outro indivíduo, são tantos os que ela favorece, que se chega sempre a fazê-la prevalecer, a despeito das resistências, devido ao pequeno número de pessoas prejudicadas.” 

"É necessário que um só homem imprima a forma e o espírito do qual depende a organização do Estado. [...] Deste modo, o legislador sábio, animado do desejo exclusivo de servir não os seus interesses pessoais, mas os do público: de trabalhar não em favor dos próprios herdeiros, mas para a pátria comum, não poupará esforços para reter em suas mãos toda a autoridade." 

Notas

|1| ESCOREL, Lauro. Introdução ao pensamento político de Maquiavel. Rio de Janeiro: Organização Simões, 1958.

 

Por D.r Marco Oliveira
Professor de Filosofia

Escritor do artigo
Escrito por: Marco Oliveira Escritor oficial Brasil Escola

Gostaria de fazer a referência deste texto em um trabalho escolar ou acadêmico? Veja:

OLIVEIRA, Marco. "Maquiavel"; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/filosofia/maquiavel-seu-pensamento-politico.htm. Acesso em 19 de abril de 2024.

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