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Por uma educação não-sexista

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Leia, a seguir, os paradoxos (opiniões contrárias) sobre o homem e a mulher.
Homem não chora. Mulher é sentimento. Homem produz e tem. Mulher é improdutiva e recebe. Homem é livre. Mulher é dependente. Homem é provedor. Mulher é provida. Homem é cérebro, razão. A mulher é coração, emoção. Homem é gênio. Mulher é anjo. Homem é glória. Mulher é virtude. Homem é força. Mulher é lágrima. Homem é herói. Mulher é mártir. Homem é nobre. Mulher é sublime. Homem corrige. Mulher aperfeiçoa. Homem pensa. Mulher sonha. Homem é oceano. Mulher é lago. Homem é águia e voa. Mulher é rouxinol e canta. Homem domina o espaço. Mulher conquista a alma. Homem tem consciência. Mulher tem esperança.

Seguramente você nota que o poema “O homem e a mulher”, de Vitor Hugo, está quase todo aí, acrescentado de algum outro paralelo. Percebe que tudo o que aí é associado à masculinidade expressa poder, saber e força. E que tudo o que se refere à mulher caracteriza-se pela impotência, submissão e inferioridade. Aparentemente, contrastes sexistas nesses moldes igualam homem e mulher, mas, vistos com criticidade, eles perpetram o desrespeito às diferenças, cravam a desigualdade entre os sexos e imprimem a injustiça nas relações entre homem e mulher.

Discrepâncias nas idéias; injustiças na vida real. A sociedade cria, legitima e mantém papéis sociais identificados com os sexos e os veste feitos camisas-de-força nas crianças desde muito cedo. As crianças não são acolhidas pelo que elas são, mas pelo que a sociedade adulta quer que elas sejam. Daí o aprendizado sexista, desde cedo. Menino anda com o pai, joga com o professor e associa-se a grupos de meninos. Menina vive com a mãe, brinca com a professora e convive com meninas. Menino é conquistador. Menina é chorona. Menino pega peso. Menina lava prato. Menino tem carrinho. Menina ganha boneca. Bota é para menino. Menina usa sandália. Brinco e cabelo comprido são para ela. Eles usam cabelo curto e usam armas para brincar. Aí está: chegamos à raiz da violência, monopólio do homem, que vitimiza a ambos.

Na escola a visão sexista de mundo se materializa na fila das meninas, nas salas ou carteiras reservadas para elas e nas listas de chamadas não elaboradas em ordem alfabética; nos materiais didáticos de cunho sexista e na postura dos profissionais da educação que são exemplo da divisão sexual entre as pessoas, dos preconceitos a eles correlatos, os quais são até socialmente incentivados. E o menino, que ouviu da própria mãe a frase que diz que homem não chora, é forte, e a menina, que escutou dos pais a idéia de que menina é recatada e deve ser sensível, vivenciam o prolongamento nos espaços escolares do aprendizado de que o mundo é machocêntrico, e, por extensão, branco e proprietarista. No fundo, todos esses paradoxos, capitaneados pelo viés sexista, mostram que, do ponto de vista econômico, político e cultural, a sociedade está muito bem compartimentada, com uma forminha de tijolo para cada pessoa humana, candidata natural a ser mais um tijolinho pacificado nos muros e paredes consagrados pelo grande corpo social.

Uma educação não-sexista se propõe a ir contra tudo isso. Ela almeja, entre outras coisas, sair do campo teórico e descer à prática cotidiana, empreendendo ações que primem pela igualdade concreta entre os sexos. Orienta-se pelo que dispõe a Resolução 34/180 da Assembléia Geral das Nações Unidas (ONU), de 18 de dezembro de 1979, a qual pugna pela igualdade entre homem e mulher e a favor das “mesmas condições de orientação profissional, de acesso aos estudos e de obtenção de diplomas nos estabelecimentos de ensino de todas as categorias, tanto nas zonas rurais como nas urbanas”, afirma que “essa igualdade deverá ser assegurada na educação pré-escolar, geral, técnica e profissional, assim como em qualquer outra forma de capacitação profissional”; defende o “acesso aos mesmos programas, aos mesmos exames, a um pessoal docente com a mesma qualificação, instalações e material escolar da mesma qualidade” para todas as pessoas; propõe a “eliminação de qualquer concepção estereotipada dos papéis masculino e feminino em todos os níveis e em todas as formas de ensino mediante o encorajamento à educação mista e a outros tipos de educação que contribuam para alcançar este objetivo e, em particular, mediante a revisão dos livros e programas escolares e adaptação dos métodos pedagógicos”; diz ser correta a prestação das “mesmas oportunidades no que se refere à concessão de bolsas e outras subvenções para estudos”, além de assegurar ser justa a garantia das “mesmas oportunidades de acesso aos programas de educação supletiva, incluindo os programas de alfabetização para adultos e de alfabetização funcional, com vistas principalmente a reduzir, o mais cedo possível, qualquer desnível de conhecimentos existente entre homens e mulheres.”

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Se programas de educação não-sexista forem implementados segundo essas orientações, já estaremos fazendo muito para que as diferenças entre homem e mulher não se transformem em desigualdades e em injustiças. Estaremos, ainda, combatendo a violência doméstica, de mulheres contra homens e de homens contra mulheres; estaremos prevenindo contra a violência social, de todos contra todos, pois o homem aprenderá a desenvolver maneiras mais sensíveis de ver o mundo e a mulher potencializará formas mais ativas de se inserir na vida. Eles se educarão para ser companheiros, não inimigos potenciais e reais na vida concreta do seu dia-a-dia.
É para essa direção que a psicóloga Malvina Muszkat aponta: “Queremos que as mulheres se fortaleçam, saiam da posição de vitimização. E que os homens expressem suas fragilidades. Em geral, os homens não falam de seus sentimentos. Muitos consideram essa fala como sinal de falta de masculinidade. Trabalhamos com os homens, estimulando que eles reflitam acerca de suas fraquezas e seus impulsos.”

A esperança é a de que, se chegarmos a esse ponto, homens e mulheres vejam o quão importante é lutar contra os custos da masculinidade, acarretados pelo monopólio masculino da força, do poder e da razão, ao passo que a mulher possa se dar conta dos prejuízos advindos com a aceitação de uma feminilidade lastreada na inferioridade, na vitimização e na dependência. Porém, isso não acontecerá da noite para o dia. A luta contra os paradoxos sexistas é árdua e exige dedicação diuturna e continuada. É por esse motivo que programas de educação não-sexista têm de ser pensados e levados a cabo, pois eles são potencialmente formadores de todos nós para a igualdade concreta entre as pessoas humanas, essa que pode nos trazer mais qualidade de vida, mais felicidade e realização.

 

Por Wilson Correia
Mestre em Educação
Colunista Brasil Escola

Escritor do artigo
Escrito por: Eliene Percília Escritor oficial Brasil Escola

Gostaria de fazer a referência deste texto em um trabalho escolar ou acadêmico? Veja:

PERCíLIA, Eliene. "Por uma educação não-sexista"; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/educacao/por-uma-educacao-naosexista.htm. Acesso em 19 de abril de 2024.

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